Embora a atuação da ANPD possa ser questionada devido à demora nas aplicações de sanções e na fiscalização ativa dos infratores, isso não compromete a efetividade da LGPD em promover a justiça. Ao analisarmos um período mais extenso, torna-se claro que a LGPD tem exercido um papel proeminente, especialmente na esfera da justiça do trabalho, destacando-se por suas ações sancionadoras e contribuindo significativamente para a promoção da justiça e proteção dos direitos individuais.
“O aumento significativo nas decisões que fazem uso dos dispositivos da LGPD evidencia uma mudança de paradigma no tratamento dos dados pessoais”
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) tem se consolidado como uma ferramenta fundamental no cenário jurídico brasileiro, refletindo diretamente nas decisões judiciais dos tribunais do país. O aumento significativo nas decisões que fazem uso dos dispositivos da LGPD evidencia uma mudança de paradigma no tratamento dos dados pessoais, trazendo consigo impactos substanciais na vida das pessoas. Contudo, mesmo com esse avanço, surgem questionamentos sobre a atuação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e a demora nas aplicações de sanções.
O resultado parcial da pesquisa Painel LGPD, conduzida por pesquisadores do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), em colaboração com a ferramenta Jusbrasil, revela um aumento expressivo de 81,4% no número de decisões judiciais relevantes para a LGPD entre 2022 e 2023. O total de 1.206 decisões identificadas no último ano representa um salto considerável em relação às 665 decisões registradas no ano anterior. Esse crescimento exponencial denota não apenas o reconhecimento da importância da LGPD pelos tribunais, mas também a sua crescente aplicabilidade.
O estudo aponta que as áreas mais impactadas por casos relacionados à LGPD são o Direito do Consumidor, o Direito do Trabalho e o Direito Civil, consolidando uma tendência que já vinha sendo observada em 2021. Dentro dessas esferas, o setor financeiro destaca-se como um dos mais envolvidos em ações judiciais relacionadas à proteção de dados. Exemplos específicos, como pedidos de indenização por danos decorrentes de falhas na proteção de dados por instituições financeiras, ilustram a relevância da LGPD na responsabilização de empresas.
No entanto, nem todas as situações resultam em decisões favoráveis aos reclamantes. Casos de fraudes derivadas do compartilhamento imprudente de dados pessoais têm sido contestados pela Justiça, que, em algumas circunstâncias, nega a violação à LGPD quando os titulares compartilham suas informações de forma negligente. A pesquisa destaca a necessidade de maturidade em instrumentos legais, especialmente nas regras relacionadas a decisões automatizadas, que envolvem aplicativos de transporte e entrega de mercadorias.
“As decisões são embasadas na LGPD, que estabelece o dever máximo das empresas em proteger os dados dos trabalhadores.”
A análise do Painel LGPD também revela divergências entre diferentes tribunais quanto à validação de práticas que envolvem dados pessoais. Enquanto o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) invalidou a coleta de dados de geolocalização com base em direitos à privacidade, o estudo destaca casos em que a Justiça do Trabalho tem negado revisões de decisões automatizadas, especialmente quando não há evidência de solicitação prévia ao aplicativo.
A atuação da Justiça do Trabalho tem sido fundamental na condenação de empresas por tratamento inadequado de dados pessoais, muitas vezes revertendo demissões por justa causa. As decisões são embasadas na LGPD, que estabelece o dever máximo das empresas em proteger os dados dos trabalhadores. Em alguns casos, a exposição indevida de conversas pessoais no ambiente de trabalho resultou em anulação de demissões e indenizações por danos morais.
Apesar do avanço nas decisões judiciais relacionadas à LGPD, algumas questões permanecem em aberto. A atuação da ANPD, enquanto entidade responsável por fiscalizar e aplicar sanções, é objeto de críticas devido à suposta demora nas ações. A pesquisa evidencia a efetividade da LGPD nos tribunais, mas a lentidão na aplicação de sanções pela ANPD levanta questionamentos sobre a plena eficácia da legislação em coibir práticas indevidas.
A LGPD, ao completar seis anos, mostra-se como uma peça-chave na proteção dos direitos individuais relacionados aos dados pessoais. Contudo, é essencial que haja uma sinergia entre a atuação dos tribunais e da ANPD para garantir uma aplicação ágil e eficaz da legislação. A análise aprofundada do Painel LGPD destaca a importância do amadurecimento dos instrumentos legais, especialmente no contexto das decisões automatizadas, e reforça a necessidade de uma atuação diligente da ANPD para assegurar a plena efetividade da LGPD no cenário jurídico brasileiro.