Primeiro, Diferenciando Acúmulo e Desvio: Um olhar Jurídico

O desvio de função ocorre quando um funcionário executa tarefas diferentes das que foram estipuladas em seu contrato de trabalho, mesmo que por um período curto ou esporadicamente. Um exemplo clássico é um vendedor atuando como caixa em uma loja. Tal prática pode resultar em aumento de responsabilidades e novas tarefas para o funcionário.

Ao suspeitar de desvio de função, o funcionário deve dialogar com seu empregador e considerar a possibilidade de uma promoção ou uma mudança no contrato de trabalho. Empresas, por sua vez, ao identificar tal situação, devem propor um acordo ao funcionário ou realocá-lo na função original. É ilegal que a empresa ofereça “pagamentos por fora”, ou seja, valores não registrados formalmente, como forma de compensação por essa prática.

A diferença entre acúmulo e desvio de função é crucial. O acúmulo ocorre quando o funcionário desempenha sua função original e também tarefas de outra função. Já o desvio se dá quando o funcionário exerce uma função completamente diferente da contratada.

O artigo 468 da CLT estabelece que qualquer mudança nas condições de trabalho precisa do consentimento de ambas as partes, empregado e empregador. Caso o empregador altere unilateralmente a função do funcionário, está cometendo um ato ilícito. O artigo 483 da CLT também esclarece que o empregado pode solicitar rescisão indireta do contrato em situações de desvio.

Se um funcionário recorrer à justiça alegando desvio de função, ele tem a responsabilidade de provar essa alegação, conforme o artigo 818 da CLT. Evidências como e-mails, documentos, conversas e testemunhas são essenciais.

“O desvio de função ocorre quando um funcionário executa tarefas diferentes das que foram estipuladas em seu contrato de trabalho, mesmo que por um período curto ou esporadicamente.”

As consequências do desvio de função para as empresas vão além de possíveis processos judiciais e multas. A prática pode prejudicar a cultura da empresa, a moral dos funcionários e resultar em perda de talentos. Por sua vez, o empregado que desempenha funções diferentes das contratadas sofre prejuízos financeiros em sua renda mensal, FGTS, entre outros benefícios.

Para evitar o desvio de função, as empresas devem estar atentas ao papel desempenhado por cada funcionário e garantir que suas responsabilidades estejam alinhadas com o que foi acordado contratualmente.

 

DPO ou Encarregado de dados pessoais dividindo funções e suas consequências

A entrada em vigor da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) em 14 de agosto de 2018, por meio da lei 13.709/18, marcou uma virada significativa no cenário brasileiro quanto à proteção e privacidade de dados. Instituída com o objetivo principal de salvaguardar direitos individuais e dar mais transparência sobre o uso de informações pessoais, a LGPD impulsionou empresas de todos os portes a iniciar imediatas e minuciosas adequações internas.

Estas mudanças não são triviais. Elas passam por alterações operacionais significativas, revisões de normas internas de segurança da informação, programas de conscientização e treinamento de colaboradores, ajustes em contratos e a nomeação de uma figura até então pouco conhecida nas empresas brasileiras: o Encarregado de Dados, ou DPO (Data Protection Officer).

A lei estabelece claramente os papéis de Controlador e Operador. Nessa dinâmica, o Controlador é a entidade que decide como os dados serão tratados, enquanto o Operador executa essas ordens. Se tomarmos uma analogia simplista, podemos pensar no Controlador como o “chef” de um restaurante, ditando as receitas, e o Operador como o “cozinheiro”, que prepara os pratos conforme as instruções.

Mas onde entra o DPO nesse cenário? Ele atua como um elo essencial, garantindo que a empresa esteja em conformidade com a LGPD. É ele quem intermedia a comunicação entre a empresa (seja ela controladora ou operadora), os titulares dos dados e a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados). Além disso, o DPO orienta sobre melhores práticas, recebe reclamações e comunicações relacionadas à proteção de dados e cumpre outros papéis determinados pelo controlador.

No entanto, surgem questionamentos no ambiente corporativo brasileiro: quem deve ser o DPO? Qual sua formação ideal? A LGPD não prescreve qualificações específicas, mas sugere-se um conhecimento aprofundado da legislação em questão. A função pode ser desempenhada por um membro interno da empresa ou ser terceirizada.

Esta nova figura também levanta questionamentos trabalhistas. O artigo 456 da CLT aborda, de maneira não tão clara, o acúmulo de funções. Se um colaborador, já sobrecarregado com suas atividades regulares, é nomeado DPO e suas tarefas forem incompatíveis com as originais, isso pode configurar acúmulo de função. A função de DPO envolve profundo conhecimento em TI, gestão, administração, comunicação, entre outras áreas, e demanda dedicação exclusiva devido à sua magnitude.

“A lei estabelece claramente os papéis de Controlador e Operador. Nessa dinâmica, o Controlador é a entidade que decide como os dados serão tratados, enquanto o Operador executa essas ordens.”

Dadas essas especificidades, é fundamental que as empresas ponderem bem antes de atribuir a função de DPO a um colaborador que já tem outras responsabilidades, especialmente se elas não estiverem relacionadas à proteção e segurança de dados. Em muitos casos, isso pode caracterizar acúmulo de funções, e as empresas devem estar preparadas para as implicações trabalhistas dessa escolha.

Em conclusão, as possíveis consequências do DPO dividir funções dentro de uma empresa incluem:

  • Não-Conformidade com a LGPD: A figura do DPO é crucial para garantir que a empresa esteja em conformidade com a LGPD. Se um DPO estiver sobrecarregado com outras tarefas, pode não conseguir cumprir adequadamente suas funções relacionadas à proteção de dados, levando a possíveis infrações da lei.
  • Comunicação Ineficaz: O DPO atua como mediador entre a empresa, os titulares dos dados e a ANPD. Se estiver sobrecarregado, isso pode resultar em falhas de comunicação e resposta inadequada ou tardia aos envolvidos.
  • Risco de Acúmulo de Funções: Como indicado, o artigo 456 da CLT aborda o acúmulo de funções. Se um empregado, já ocupado com outras tarefas, for designado como DPO e suas novas tarefas forem incompatíveis com as originais, isso pode caracterizar acúmulo de funções.
  • Implicações Trabalhistas: A empresa pode enfrentar consequências legais e financeiras se for determinado que houve acúmulo de funções. Essas consequências podem incluir a necessidade de compensação adicional para o empregado ou possíveis ações judiciais.
  • Comprometimento das Melhores Práticas: O DPO é também responsável por orientar sobre as melhores práticas em relação à proteção de dados. Um DPO sobrecarregado pode não ter tempo ou recursos para se manter atualizado sobre as melhores práticas ou para comunicá-las eficazmente à organização.
  • Redução da Eficiência Operacional: A função de DPO exige conhecimento em diversas áreas, como TI, gestão, administração e comunicação. A divisão de funções pode resultar em uma gestão ineficaz da proteção de dados, levando a possíveis brechas ou falhas na segurança dos dados.
  • Decisões Mal-informadas: Um DPO que não tenha tempo para se dedicar integralmente ao seu papel pode não ter a capacidade de tomar decisões bem informadas ou fornecer a orientação necessária para a empresa, levando a potenciais riscos para a organização.

 

Por fim, é essencial que as empresas compreendam a importância e a magnitude do papel do DPO e garantam que essa função tenha os recursos e o tempo necessários para ser desempenhada eficazmente. A divisão de funções pode levar a várias consequências negativas, tanto em termos de conformidade com a LGPD quanto em implicações trabalhistas.